José de Anchieta

Padre jesuíta espanhol
Por Dilva Frazão
Biblioteconomista e professora

Biografia de José de Anchieta

José de Anchieta (1534-1597) foi um padre jesuíta espanhol que introduziu a poesia e o teatro na literatura brasileira. Foi aluno do Colégio dos Jesuítas de Coimbra e em 1553 veio para o Brasil Colônia com o objetivo de ajudar na doutrinação dos índios.

Pela identificação com seus discípulos, aos quais dedicou sua vocação missionária, foi chamado de “o Apóstolo do Brasil”. Foi beatificado pelo Papa João Paulo II, em 1980, e canonizado pelo Papa Francisco, em 3 de abril de 2014.

José de Anchieta nasceu em San Cristóbal de La Laguna, em Tenerife, nas ilhas Canárias, Espanha, no dia 19 de março de 1534. Era filho de João Lopez de Anchieta, fidalgo basco, e Mência Dias de Clavijo y Lerena, descendente dos conquistadores de Tenerife.

Anchieta estudou as primeiras letras em casa e em seguida ingressou na escola dos dominicanos quando aprendeu os conhecimentos da gramática latina.

Aos 14 anos, em companhia de seu irmão mais velho, foi para Coimbra, Portugal, para estudar filosofia no Real Colégio das Artes e Humanidades. Com 16 anos ingressou no Colégio dos Jesuítas e no ano seguinte tornou-se noviço da Companhia de Jesus.

Obra Missionária no Brasil

No dia 8 de maio de 1553, José de Anchieta partiu para o Brasil na frota que trouxe o segundo Governador Geral Duarte da Costa, com o objetivo de ajudar na doutrinação dos índios. Mesmo sofrendo com fortes dores na coluna, Anchieta juntou-se a um grupo de religiosos e enfrentou 65 dias de viagem, chefiados pelo Padre Luís de Grã.

No dia 13 de julho a esquadra chegou a Salvador e ao descer Anchieta teve seu primeiro contato com os índios. Depois de três meses, junto com outros religiosos, Anchieta seguiu para o sul quando dois navios seguiram em direção à capitania de São Vicente com o objetivo de catequizar os índios carijós.

Quando navegavam próximo ao rio Caravelas, no sul da Bahia, uma forte tempestade desgovernou os barcos. Só no dia seguinte conseguiram chegar em terra. Durante dez dias permaneceram entre os índios alimentando-se de abóbora, farinha e frutas da região.

Depois de repararem um navio, seguiram para São Vicente, onde chegaram às vésperas do natal. Nessa época, a ação dos jesuítas na catequese dos índios já se estendia de São Vicente aos Campos de Piratininga, chefiados pelo padre Manuel da Nóbrega.

Fundação de São Paulo

José de Anchieta e outros religiosos subiram a Serra do Mar rumo ao Planalto, onde se instalaram. A inauguração do barracão do planalto deu-se junto a uma aldeia de índios no dia 24 de janeiro de 1554, dia da conversão do Apóstolo São Paulo. No local, Nóbrega com a ajuda de Anchieta celebraram uma missa, em homenagem ao Santo. “Era o início da fundação da cidade de São Paulo.”

José da Anchieta
Fundação de São Paulo (Oscar Pereira da Silva) Museu Paulista

Por instrução do padre Manuel da Nóbrega, José de Anchieta e outros doze missionário fundam o Colégio de São Paulo. Logo que instalaram o barracão do colégio começou o trabalho de catequese como Anchieta conta em carta:

“Nesta aldeia, 130 índios foram chamados para a catequese e 36 para o batismo, os quais são todos os dias instruídos na doutrina, repetindo orações em português e na própria língua. Os primeiros dias foram difíceis. O barracão servia de dormitório, enfermaria, escola, refeitório, cozinha e até capela.”  

Ao redor do colégio se formou um pequeno povoado. Durante esses anos, José de Anchieta aprendeu a língua tupi e posteriormente escreveu uma gramática que foi de grande ajuda em todas as missões dos jesuítas.

Em 1554 os líderes indígenas Tamoios, inimigos dos Tupis, do litoral norte de São Paulo e do sul do Rio de Janeiro organizaram um movimento de resistência que ficou conhecido como "Confederação dos Tamoios", contra os colonos portugueses que além de explorar o território, buscavam escravizar a mão de obra indígena. 

Ameaça dos franceses e a missão de paz

Em 1555 o Rio de Janeiro foi invadido pelos franceses sob o comando do almirante Nicolau Durand Villegaignon, que fizeram uma aliança com os tamoios e se instalam na Baía da Guanabara. O Governador Geral, Mem de Sá obteve uma vitória frente aos franceses, mas não conseguiu expulsá-los do solo brasileiro.

Em 10 de julho de 1562, os índios tamoios, estimulados pelos franceses, atacaram a vila de São Paulo. As lutas foram terríveis, com mortos e feridos de ambos os lados, mas os atacantes não conseguiram tomar a vila e se retiraram. Nessa mesma época, atacaram mais uma vez a Baía da Guanabara.

Além da presença dos franceses, aliada aos saques que os colonos faziam às aldeias indígenas, gerava um constante clima de tensão em toda a região.

Anchieta e Nóbrega, em missão pacificadora, partiram de São Vicente em 21 de abril de 1563 em um navio de um genovês que morava na vila e rumam para Iperoig. Ao chegarem na praia foram cercados pelos Tamoios que se mostram hostis.

Anchieta, no mais puro tupi, os saúda com promessas de paz e amizade. Convencidos, os índios os levaram até suas cabanas. Ariscando suas vidas os religiosos permaneceram na aldeia e o navio retornou para São Vicente.

Foram sete meses de negociações, entre ameaças de morte, zombarias, catequese, missas e a tentativa de fuga de Nóbrega e Anchieta.

Os milagres de Anchieta

Certo dia, um índio culpou Anchieta pela ausência de caça nas armadilhas, Anchieta mandou então que voltassem a examinar os locais e os índios encontraram as armadilhas carregadas de caça.

Outro dia, chegou um mensageiro trazendo uma notícia do índio Aimberê, de São Vicente. Irados, os índios decidiram matar Anchieta, mas de repente surgiu das matas o tal índio sumido, que havia apenas fugido.

Depois disso, Anchieta e Nóbrega conseguiram voltar para São Vicente e o próprio cacique os levou de volta. Em São Vicente, os missionários foram recebidos com grandes festas, pois na longa missão tinham conseguido restaurar a paz.

Guerra no Rio de Janeiro

A paz com os Tamoios durou pouco. Em 1564 uma esquadra comandada por Estácio de Sá, irmão do Governador Geral, tentou aportar na Baía de Guanabara, mas foram repelidos pelos tamoios, e seguiram para a vila de Santos. Na capitania de São Vicente desejava obter reforços.

Anchieta e Nóbrega, influentes na região, conseguiram recrutar muita gente para reforçar a armada de Estácio de Sá. No dia 20 de janeiro de 1565, partiram para o Rio, onde chegam em março.

As batalhas se sucederam durante meses, mas finalmente os portugueses saíram vitoriosos. Anchieta foi o enfermeiro da campanha. Em 1566, Anchieta partiu para Salvador com o objetivo de se ordenar sacerdote. Em agosto, foi finalmente ordenado e ali na Bahia pode rezar sua primeira missa.

Três meses depois, o Padre José de Anchieta seguiu para o Rio na esquadra de Mem de Sá para auxiliar seu sobrinho na conquista definitiva do Rio de Janeiro. Chegaram em 18 de janeiro de 1567 e depois de vários combates os tamoios foram subjugados e os franceses expulsos.

Nessa época, começou a implantação de um núcleo de povoamento bem fortificado: é São Sebastião do Rio de Janeiro. É o começo da fundação do Rio de Janeiro.

Em 1577, com 43 anos e 24 passados no Brasil, Anchieta foi designado provincial da ordem, o mais alto cargo da Companhia de Jesus no Brasil. Com a função de administrar os Colégios Jesuítas do país, viajou por várias cidades, entre elas, Olinda, Reritiba (hoje Anchieta) no Espírito Santo, Rio de Janeiro, Santos e São Paulo. Foram 10 anos de visitas.

Quinhentismo

A produção artística e cultural do Quinhentismo - referente aos primeiros anos do século XVI - foi produzida por cronistas, viajantes e jesuítas que aqui se encontravam por um curto período de tempo e que ainda não tinham nenhuma identificação com a terra, pois os modelos literários que cultivavam eram totalmente lusitanos, e boa parte dela era meramente informativa, como a carta de Pero Vaz de Caminha.

Produção Literária de José de Anchieta

Além de homem de ação, José de Anchieta tinha em vista a catequese e escreveu vários tipos de textos com finalidade pedagógica, como poemas, hinos, canções e autos (textos para dramatização), além de cartas que informavam sobre o andamento da catequese no Brasil, sermões e uma gramática da língua tupi.

Usando a literatura como meio de infundir o pensamento cristão nos índios, realizava representações para tornar viva a mensagem católica.

As estrofes do poema “A Santa Inês” ilustram a preocupação religiosa de Anchieta e demonstra o modelo literário medieval a que estava filiado. O texto fala da chegada da estátua de Santa Inês, que espanta o diabo e revigora a fé do povo. Os versos em cinco sílabas (redondilha menor) dão ritmo ligeiro ao texto e lembra as cantigas medievais.

              A Santa Inês

            Cordeirinha linda,
            Como folga o povo
             porque vossa vinda
             lhe dá lume novo!

             Cordeirinha santa,
             de Jesus querida,
             vossa santa vinda
             o diabo espanta.

             Por isso vos canta,
             com prazer o povo,
             porque vossa vinda
             lhe dá lume novo.

             Nossa culpa escura
             fugirá depressa,
             pois vossa cabeça
             vem com luz tão pura. (...)

Entretanto, foi com o teatro que Anchieta cumpriu sua missão de catequizar os índios. Para comemorações de datas religiosas, escrevia e apresentava autos que levavam a fé e os mandamentos religiosos, diferente dos cansativos sermões. Entre eles, o da "Assunção", "Festas de São Lourenço", "Festa de Natal" e o da "Vila da Vitória, reunidos em um volume de poesias. 

Morte e canonização

Em 1597, o padre José de Anchieta, já doente, foi para Reritiba, aldeia que fundou no Espírito Santo, onde passou seus últimos dias, falecendo no dia 9 de junho de 1597.

José de Anchieta
Túmulo do padre Anchieta (Palácio Anchieta, Espírito Santo)

No dia 22 de junho de 1980, o Papa João Paulo II beatificou o padre José de Anchieta, em um processo que começou em 1597, após relatos de milagres ocorridos em São Paulo. No dia 3 de abril de 2014, o padre Anchieta foi canonizado e declarado santo pelo Papa Francisco.

Dilva Frazão
É bacharel em Biblioteconomia pela UFPE e professora do ensino fundamental.
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